Uma homenagem à mulher-mãe!

"E num dia de bendita magia, numa explosão de luz e flor, num parto sadio e sem dor, é capaz, bem capaz, que uma mulher da minha terra consiga parir a paz. Benditas mulheres." Rose Busko

Sobre as mamas de Angelina


A piada é boa e faz sentido. Problemas dentários podem, SIM, levar à morte, basta pensar em infecções dentárias levando à febre reumática ou endocardite. Raras, fortuitamente, mas possíveis de ocorrer para quem tiver dentes. Transtornos dentários estão também relacionados a transtornos na gestação, podendo levar ao parto prematuro, e este último é um dos principais problemas de saúde pública na Europa (baixo peso ao nascer). Mas a pergunta pode ser levada mais adiante: quem aí estaria interessado em retirar os testículos para evitar o câncer nesta região do corpo? Sim, este mata, sem dúvida. E agora? Porque mutilar as mulheres é tão facilmente aceito, mas mutilar os homens causa desconforto?

Só para lembrar: as cirurgias mais realizadas nos Estados Unidos são cesarianas e histerectomias. Ambas sobre o mesmo órgão (o útero, a Matriz, a “mãe do corpo”) e sobre o mesmo gênero, as mulheres. Ambas com caráter ablativo; ambas aplicadas sobre o cerne da feminilidade.

A ideia a ser vendida por trás desta amputação é a de que a pesquisa genética pode fazer previsões certeiras e “matemáticas” de doenças e morte. Isso é uma fantasia. Não somos controlados por nossos genes, mas por uma série de fatores (principalmente o estilo de vida que temos) dentre os quais se encontra a bagagem genética e as “possibilidades de adoecimento” que carregamos. Ninguém adoece do que quer, e sim do que “pode”. Mas esta construção tem nos genes apenas um elemento, e não o mapa completo de nossa história futura. Foi a partir desta constatação - de que esta ultra estrutura não é capaz de prever o futuro, mas apenas uma gama limitada de tendências - que criou-se o termo “epigenética”, que tenta combinar os aspectos da constituição física com os outros tantos aspectos de ordem emocional, circunstancial, ambiental, afetiva, psicológica e até mesmo as questões aleatórias. Posso carregar um gene defeituoso - como a propensão para o câncer pulmonar - pela vida inteira sem que ele NUNCA se manifeste apenas porque decidi não fumar, não me contaminar com substâncias tóxicas (como as anilas), não viver em local poluído e ter uma alimentação detoxificante. Pronto: toda a minha má herança foi soterrada, sem precisar de amputações. Mas estilos de vida não geram patentes milionárias, e nem vendem drogas milagrosas. É natural que este tipo de “tratamento comportamental” não receba muita atenção da mídia.

O caso de Angelina Jolie é emblemático muito mais pelo entusiasmo da comunidade científica do que pelo ato em si. Ao invés de agirem com cautela, os profissionais imediatamente se apaixonaram pela ideia, a exemplo do que ocorreu com as “células tronco”, que já enriqueceram muita gente, mas que ainda não forneceram provas concretas de sua eficácia no tratamento de qualquer afecção conhecida. Falta um freio, um anteparo às aventuras interventivas da ciência, mas isso não significa proibir ou censurar a pesquisa, mas incentivar um bom senso, evitando o exagero nas invasões sobre o corpo, as quais frequentemente se baseiam em meras suposições ou maquiagens estatísticas.

Falta também uma visão mais respeitosa sobre o corpo da mulher. Mas isso ainda é resquício de oitenta séculos de cultura patriarcal.

Texto de Ric Jones Médico ginecologista, homeopata e obstetra. Faz parte do colegiado nacional da ReHuNa - Rede pela Humanização do Parto e Nascimento. Autor de diversas publicações nacionais e internacionais e dos livros "Memórias do Homem de Vidro - Reminiscências de um Obstetra Humanista" e "Entre as Orelhas - Histórias de Parto". Palestrante sobre a temática da humanização do nascimento no Brasil e no exterior. Trabalha em Porto Alegre - RS.

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